terça-feira, 15 de novembro de 2011

PORQUE OS SEPARATISTAS SÃO HOSTILIZADOS EM DEBATES?




Os separatistas tem se queixado de serem vaiados e até hostilizados, em debates que são convidados em Belém, alguns deles até já estão recusando a participar de alguns, em atitude claramente anti-democrática, visto que até o presidente Lula, supostamente com a maior aprovação de um presidente na histórica da república brasileira, recebeu sonoras vaias na abertura do Pan-Americano de 2007 no Rio de Janeiro, e não foi de um auditório lotado, e sim de cerca de 45 mil pessoas que lotavam o Estádio Engenhão...

E nem por isso o então presidente deixou de participar de debates e discussões que se seguiram.

Embora isso seja verdadeiro, (que os separatistas tenham sido vaiados e supostamente 'hostilizados') aqui vai alguns pontos que merecem análise, e, longe de estar justificando a atitude do público em si, elas são, porém, compreensíveis.

Primeiro, a proposta de realização do Plebiscito foi uma manobra no Congresso nacional.

Eu explico.

Lira Maia, (DEM), 'Zequinha' Marinho (PSC) e o Giovanni Queiroz (PDT) usaram do seguinte ardil: Na condição de líderes de partido, ameaçaram obstruir as pautas que estavam em votação, no Congresso, caso não fosse aprovados os projetos de desmembramento do Pará apenas pelos líderes, sem precisar ir a plenário, para votação coletiva e, como o governo federal queria ver as pautas que julgava mais importantes desobstruídas, entre as quais a votação do código Florestal, cedeu.

Aí já se cometeu uma violência sem tamanho: Aprovou-se uma consulta popular sem que houvesse, naquela altura, qualquer estudo para se saber se havia viabilidade ou não para se criar novos estados a partir do desmembramento do Pará.

E também os separatistas escolheram bem o dia, uma quinta-feira, quando a maioria dos parlamentares já deixou - ou está saindo de - Brasília para seus redutos eleitorais.

O Deputado Chico Alencar (PSOL-RJ) inclusive, não só não cedeu a sigla do PSOL para a empreitada, como questionou a legitimidade da decisão.

O Rosário autoritário dos separatistas não parou por aí.

Também não houve qualquer consulta ao governador eleito, Simão Jatene (PSDB), para saber da posição dele sobre o assunto.

Tentaram revogar a decisão do TSE de que a "população diretamente interessada" é a do estado todo, e não somente as populações das regiões separatistas.Em outras palavras, eles não queriam que os Paraenses nativos,(que estão aqui há quase 400 anos) concentrados na região metropolitana e na região nordeste exercessem seus direitos e dessem suas opiniões (através do voto), pois na interpretação equivocada e um tanto quanto capciosa deles, a região "diretamente interessada" a ser consultada seria somente a porção sul/sudeste (o hipotético Carajás) e Oeste (o hipotético Tapajós).

Quer dizer que o Pará que restaria, com apenas 17% do seu tamanho original, não seria afetado pela divisão? segundo os separatistas, não....

Foi por defender essa visão distorcida do texto da constituição federal, (texto que é tão límpido e claro como as águas do Tapajós), que o deputado Asdrúbal Bentes,(PMDB-PA) recebeu ruidosas vaias em um debate que houve na Universidade Federal do Pará (UFPA).

E ali, e posso falar pois estava lá, não vi qualquer "hostilidade" ao referido deputado amazonense, apenas foi democraticamente vaiado, pois o auditório não concordou com o que falou.

E aqui faz-se um parêntese, o tal Asdrúbal, ao ser vaiado, se exaltou, levantou a voz dizendo que não liga "para essas vaias mixurucas"... visivelmente contrariado, cheio de cólera, se comportou como criança birrenta, quando na verdade é um experiente deputado federal...

Agora, já em plena campanha no rádio e TV, os separatistas tentam convencer o eleitor paraense com uma Lei inconstitucional, ou pelo menos será a partir de dezembro de 2012, quando o atual modelo de receitas dos estados via Fundo de participação dos Estados (FPE)sob a lei complementar 62/89, irá mudar, não terá mais vigência a partir da referida data, e o congresso nacional terá que votar outro estatuto legal para a distribuição do dinheiro aos estados.

Para entender, o FPE é distribuído segundo uma tabela de coeficientes fixos para cada unidade federativa, ou seja, não há vinculação com área, população, PIB, renda per capita, absolutamente nenhum critério variável. E, nesse rateio do FPE (constituído por 21,5% da arrecadação do IR e IPI) o Pará recebe exatos 6,1120%. Na LC não há qualquer previsão para novas unidades federativas.

Portanto o que eles alegam, que dos atuais 2 bilhões e 900 milhões de reais/ano, com a divisão, o Pará passaria a receber 5 bilhões e 900 milhões por ano, supostamente três bilhões a mais, é uma fantasia, um blefe.Destas pegadinhas que nos colocam em provas de concursos, onde temos que estar atentos, sob pena de cairmos numa cilada.

Se fosse verdadeiro que toda essa dinheirama viria, até este blogueiro passaria a trabalhar nas frentes pró-divisão....


Veja Mais:

(http://tribodoscaboclos.blogspot.com/2011/11/as-mentiras-dos-separatistas-na-questao.html#links)

Ou Seja, seja a manobra no Congresso para aprovar o plebiscito "na marra", a não consulta ao governador do estado do Pará, a tentativa de evitar que todos o paraenses votassem, e agora na campanha do rádio e TV blefando que o Pará receberá mais dinheiro usando uma conta estapafúrdia, inconsistente, inverídica e ainda baseado em Lei q está em vias de ser inconstitucional, só pode resultar em hostilidades, em vaias....

Como nos ensina a física, se toda ação recebe uma reação,o viés autoritário de alguns separatistas, (camufladas cuidadosamente),e mais o exposto acima acarretam tal reação.

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

AS MENTIRAS DOS SEPARATISTAS NA QUESTÃO DO AUMENTO DE RECEITAS PARA NOVOS ESTADOS VIA FPE





O FPE e a Campanha pela Divisão do Pará Segue abaixo artigo de Hélio Mairata, Professor da UFPA/Facecon e Diretor do Sindicato dos Economistas do Estado do Pará, que só reforça as falácias do "Sim".

"O FPE E A CAMPANHA PELA DIVISÃO DO PARÁ

Hélio Mairata (*)

A campanha na mídia pelo retalhamento do Pará em três Estados tem usado como argumento mais forte um suposto ganho que essas unidades passariam a ter, já que a soma do FPE a ser destinado pela União aos três seria bem maior, inclusive quantificando tais valores.

Em primeiro lugar, essa campanha é parcial, haja vista que esconde o aumento das Despesas que a criação das novas unidades traria. Estudo feito pelo IPEA (não pelos “unionistas”) mostra que esse aumento nas citadas despesas seria de 36,7%. Considerando o OGE do Pará para 2012, que projeta um gasto total do Estado na ordem de R$ 12,9 bilhões a criação dos dois novos Estados provocaria uma despesa adicional em cerca de R$ 4,7 bilhões, o que é superior ao midiático “ganho” no FPE conforme assevera a propaganda separatista, que seria de R$ 3 bilhões.

Contudo, além dessa parcialidade na informação (apregoando um aumento nas receitas, mas escondendo o nas despesas), a informação sobre o citado ganho é fantasiosa.

Com efeito: atualmente, a distribuição do FPE entre os Estados é feita conforme a Lei Complementar 62/89. E, de acordo com esta, há uma tabela de coeficientes fixos para cada unidade federativa, ou seja, não há vinculação com área, população, PIB, renda per capita, absolutamente nenhum critério variável. E, nesse rateio do FPE (constituído por 21,5% da arrecadação do IR e IPI) o Pará recebe exatos 6,1120%. Na LC não há qualquer previsão para novas unidades federativas.

Ainda há mais: o STF, em sessão realizada em 24/02/2010 decretou a inconstitucionalidade da referida LC, estabelecendo um prazo final para a sua vigência, a qual irá expirar em 31/12/2012.

Até lá, o Congresso Nacional terá que aprovar novo estatuto legal para a repartição do Fundo. Há, tramitando, um PLC, de autoria conjunta dos senadores Jorge Viana (PT-AC), Randolfo Rodrigues (PSOL-AP), Romero Jucá (PMDB-RR) e Valdir Raupp (PMDB-RO), na qual são propostos critérios de
divisão (mas ainda sem o estabelecimento de percentuais) com base em: IDH, Renda per capita; População; Percentual de unidades de conservação e áreas indígenas; PIB; e saneamento básico.

É só. O resto é delírio.

(*) Professor da UFPA/Facecon e Diretor do Sindicato dos Economistas do Estado do Pará

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Belo Monte, nosso dinheiro e o bigode do Sarney - Parte 3


Segundo Celio Bergmann, "o apagão energético" não é verdadeiro, há energia suficiente para todos, é apenas um medo que está sendo incutido na massa para que ela aprove a construção de uma Usina inviável, que está sendo construída única e exclusivamente para fins políticos escusos.





(Continuação final)


- Doentia, não sei. Mas eu gostaria de compreender melhor por que o senhor e a maioria dos especialistas que estudaram o projeto afirmam que esta obra é ruim também do ponto de vista técnico.

Bermann – Divulgaram que esta será a única usina do Xingu. Inclusive, houve um seminário recente aqui na USP em que tive a oportunidade de discutir com o Mauricio Tolmasquim (presidente da Empresa de Pesquisa Energética, ligada ao Ministério de Minas e Energia). E ele veio com essa ladainha: “Vai ser a única...”. E eu disse a ele: “Com o perdão do poeta, o que você está afirmando, somente de papel passado, com firma em cartório e assinado: Deus”.

- O senhor não acredita que será a única usina do Xingu, então?

Bermann – Me diga alguma coisa no nosso país que vigorou como cláusula pétrea. Me fale alguma coisa aqui no nosso país que foi dito de uma forma e se manteve ao longo do tempo. VAI ser necessário construir outras usinas. No atual projeto, esta é uma usina que vai funcionar à plena carga, no máximo, quatro meses por ano, por causa do regime hidrológico. Se ela estiver sozinha, o volume de água para rodar as turbinas dependerá da quantidade de chuva. E aquela região tem a seguinte característica: quando chove, quando tem água, quando desce a água dos tributários para o Xingu é muita água, é um volume enorme de água. Mas isso só acontece durante quatro meses por ano. Só nesse período os 11.200 megawatts vão estar operando. Em outubro, na época da estiagem, será apenas 1.100 megawatts, um décimo. Então, a pergunta é: por que construir uma usina desse porte, se, na média anual, ela vai operar com 4.300 megawatts? Necessariamente vão vir as outras quatro. Eu estou afirmando isso, infelizmente. Tecnicamente, eu tenho absoluta certeza. Porque as usinas rio acima vão segurar a água e aí Belo Monte não vai depender da quantidade de chuva. É o único jeito dessa potência instalada de 11.200 megawatts existir de fato.


“O conceito do governo e das empresas não é o de população atingida, mas o de população afogada"
(CÉLIO BERMANN)


- O senhor está dizendo que o governo federal está mentindo ao afirmar que será apenas uma usina, para conseguir vencer as resistências ao projeto e aprová-la, e depois fará mais três ou quatro?

Bermann – Estou dizendo que, da forma como esta usina está colocada, é uma aberração técnica tão grande que é totalmente ilógico construí-la.

- E essa afirmação, discutida hoje na Justiça, de que os povos indígenas não serão atingidos?

Bermann – A noção que as empresas e o governo federal têm é a noção de população afogada – e não atingida.

- Agora, digamos que nós concordássemos que a obstinação de construir Belo Monte, ainda que atropelando a população e talvez a Constituição, se devesse à necessidade de energia elétrica. E digamos que Belo Monte fosse de fato um projeto de engenharia viável e inteligente. As usinas hidrelétricas são as melhores opções para a geração de energia no Brasil de hoje? Quais são as alternativas a elas?

Bermann – Não podemos olhar a questão da produção de energia sem questionar ou considerar o outro lado, que é o consumo de energia. Parece meio prosaico, porque envolve hábitos culturais da população. E a população sempre entendeu que energia elétrica se resume a você apertar o botão e ter eletricidade disponível. E por isso fica em pânico com a “Síndrome do Blecaute”. Mas é preciso pensar além disso. Não estou dizendo para fechar as fábricas de alumínio, de aço e de celulose no Brasil. O que estou dizendo é o seguinte: parem de ampliar a produção. Parem, porque diversos países desenvolvidos já fizeram isso. O Japão fez mais do que isso. O Japão produzia, em 1980, 1,6 milhões de toneladas de alumínio. Nós estamos produzindo quase 1,7 milhões de toneladas hoje. Só que a energia elétrica necessária para produzir alumínio tornou-se da ordem do absurdo. Então o governo japonês, as empresas japonesas produtoras de alumínio e os trabalhadores da indústria do alumínio realizaram um debate que culminou com o fechamento de todas as usinas de produção de alumínio primário no Japão, exceto uma. Isso ainda nos anos 80. Hoje, o Japão produz apenas 30 mil toneladas. De 1,6 milhões para 30 mil toneladas. Diante da necessidade de gerar muita energia para produzir alumínio, o que o Japão fez? O governo e a sociedade japonesa disseram: “Vamos priorizar a eficiência, o maior valor agregado. Nós não precisamos produzir aqui. Tem o Brasil, tem a Venezuela, tem a Jamaica, tem os lugares para onde a gente pode transferir as plantas industriais e continuar a assegurar o suprimento para a nossa necessidade industrial. A gente pega esse alumínio, agrega valor e exporta na forma de chip. Parece uma coisa tão besta, né? Mas foi isso o que os japoneses fizeram. Eles mantiveram o crescimento econômico e reduziram a demanda por energia. Nós estamos caminhando no sentido inverso. Estamos aumentando o consumo de energia a título de crescimento e desenvolvimento, e, numa atitude absolutamente ilógica, porque a gente exporta hoje a tonelada de alumínio a US$ 1.450, US$ 1.500 dólares. E, para se ter uma ideia, hoje falta esquadrias de alumínio no mercado interno, no mercado de construção brasileiro. O preço foi aumentado por indisponibilidade. Hoje, e fizemos um estudo recente sobre isso, é preciso importar esquadrias de alumínio porque a oferta no mercado interno é insuficiente. E, enquanto o Brasil exporta o alumínio por US$ 1.450, US$ 1.500, o preço da tonelada de esquadria importada é o dobro: cerca de US$ 3 mil a tonelada.

- Para o senhor, a questão de fundo é outra...

Bermann - Nós temos pouca capacidade de produzir alumínio com valor agregado. Então, não estou dizendo para fechar essas fábricas, botar os trabalhadores na rua, mas dizendo para parar de produzir alumínio primário, que exige uma enorme quantidade de energia, e investir no processo de melhoria da matéria-prima para satisfazer inclusive a demanda interna hoje insatisfeita. Agora, vai perguntar isso para a ABAL (Associação Brasileira de Alumínio). Veja se eles estão pensando dessa forma. Billiton, Alcoa, mesmo o sempre venerado Antônio Ermírio de Moraes, com a Companhia Brasileira de Alumínio. A perspectiva desse pessoal é a cega subordinação ao que define hoje o mercado internacional, o mercado financeiro. E é assim que o nosso país fica desesperado com a ideia de que vai faltar energia.


"Não é Programa Luz para Todos, mas Luz para quase Todos ou Conta de Luz para Todos"
(CÉLIO BERMANN)


- Além de ser um modelo de desenvolvimento que prioriza a exportação de bens primários, sem valor agregado, é também um modelo de desenvolvimento que ignora o esgotamento de recursos. Enquanto tem, explora e lucra. Alguns poucos ganham. O custo socioambiental, agora e no futuro, será dividido por todos...

Bermann – Isso. Os recursos naturais são limitados. Por isso, no meu ponto de vista, a discussão do aquecimento global obscurece o entendimento da hidroeletricidade em particular. Ficamos às cegas. Para transformar o barro da bauxita naquele pó branco do alumínio, que depois é fundido através de uma corrente elétrica, é uma quantidade de energia enorme, absurda. Essa possibilidade você não vai conseguir com energia solar, com energia eólica. São processos produtivos que exigem a manutenção do suprimento de energia elétrica 24 por dia. A solar não consegue fazer isso na escala necessária. Uma tonelada de alumínio consome 15 a 16 mil kilowatts/hora. Para se ter uma ideia, na média, o consumidor brasileiro consome, por domicílio, 180 kilowatts/hora por mês, o que é baixo. Nós ainda estamos vivendo uma situação muito próxima da miserabilidade em termos energéticos para a população. Nós temos uma demanda a ser satisfeita com equipamentos eletrodomésticos. Satisfeita não construindo grandes usinas hidrelétricas para as empresas eletrointensivas, mas para conseguirmos equilibrar a qualidade de vida, que se deve fundamentalmente a uma herança histórica: a de sermos um dos países com a pior distribuição de renda do mundo.

- Uma das piores distribuições de renda e uma das piores distribuições de eletricidade do mundo...

Bermann – Eu chamo o programa de universalização de "Luz para quase todos". Não é para todos, é para quase todos. Desde que estejam próximos da rede para extensão, tudo bem. Mas, para o sujeito distante, só agora é que se começa a pensar em sistemas de produção descentralizada. A percepção ainda é, infelizmente, de pegar e estender a rede. Mas o custo de extensão da rede é muito alto. Principalmente, se você pegar e atravessar 15 quilômetros para atender duas, três casas. O lógico seria a adoção de energia descentralizada em escala menor, que seja mais bem controlada pela população. Mas isso não passa pela cabeça porque define inclusive uma outra relação social. Eu também chamo esse programa de “Conta de luz para todos”, porque de repente você fica refém de uma companhia e necessariamente paga conta de luz, quando você poderia criar uma situação de autonomia energética.

- O senhor poderia explicar melhor quais são as alternativas para a população, já que todos nós crescemos dentro de uma lógica em que recebemos a conta da luz e pagamos a conta da luz; apertamos um botão na parede e a luz se faz. A realidade está exigindo que sejamos mais criativos e tenhamos mais largura de raciocínio. Quais são as alternativas para o cidadão comum, especialmente o de regiões mais afastadas?

Bermann – Depende muito do acesso à tecnologia existente no local ou na região. Hoje, por exemplo, temos no Rio Grande do Sul uma experiência de queimar casca de arroz para gerar energia. O calor da queima da casca de arroz aquece a água, a água se transforma em vapor e esse vapor é injetado num tubo e gira uma turbina produzindo energia elétrica. Não tem nada de fantástico nisso, esse processo é conhecido há muito tempo, mas, puxa vida, eu estou tão acostumado a simplesmente acender e apagar o botão... Vou ficar agora me preocupando se tem combustível? Existe um lado meio trágico da população em geral que é o comodismo: deixa que resolvam por mim. Então, quando você me pergunta sobre alternativas, depende do que a gente está falando. Existem alternativas promissoras deixando de produzir mais mercadorias eletrointensivas. Como também é promissor ter esquemas de financiamento para que o pequeno empresário adquira um painel fotovoltaico (placa que transforma luz solar em energia elétrica) ou uma usina de geração eólica (transformação de vento em energia elétrica). E use essa tecnologia que está disponível para satisfazer as suas necessidades, sem necessariamente ficar ligado a uma grande linha de transmissão, de distribuição, puxando energia não sei de onde.

- O que o senhor diria para a parcela da população brasileira que faz afirmações como estas: "Ah, se não construir Belo Monte não vai ter luz na minha casa", ou "Ah, esses ecochatos que criticam Belo Monte usam Ipad e embarcam em um avião para ir até o Xingu ou para a Europa fazer barulho". O que se diz para essas pessoas para que possam começar a compreender que a questão é um pouco mais complexa do que parece à primeira vista?

Bermann – Não é verdade que nós estamos à beira de um colapso energético. Não é verdade que nós estamos na iminência de um “apagão”. Nós temos energia suficiente. O que precisamos é priorizar a melhoria da qualidade de vida da população aumentando a disponibilidade de energia para a população. E isso se pode fazer com alternativas locais, mais próximas, não centralizadas, com a alteração dos hábitos de consumo. É importante perder essa referência que hoje nos marca de que esse tipo de obra é extremamente necessário porque vai trazer o progresso e o desenvolvimento do país. Isso é uma falácia. É claro que, se continuar desse jeito, se a previsão de aumento da produção das eletrointensivas se concretizar, vai faltar energia elétrica. Mas, cidadãos, se informem, procurem pressionar para que se abram canais de participação e de processo decisório para definir que país nós queremos. E há os que dizem: “Ah, mas ele está querendo viver à luz de velas...”. Não, eu estou dizendo que a gente pode reduzir o nosso consumo racionalizando a energia que a gente consome; a gente pode reduzir os hábitos de consumo de energia elétrica, proporcionando que mais gente seja atendida, sem construir uma grande, uma enorme usina que vai trazer enormes problemas sociais, econômicos e ambientais. É importante a percepção de que, cada vez que você liga um aparelho elétrico, a televisão, o computador, ou a luz da sua casa, você tenha como referência o fato de que a luz que está chegando ali é resultado de um processo penoso de expulsão de pessoas, do afastamento de uma população da sua base material de vida. E isso é absolutamente condenável, principalmente se forem indígenas e populações tradicionais. Mas também diz respeito à nossa própria vida. É necessário ter uma percepção crítica do nosso modo de vida, que não vai se modificar amanhã, mas ela precisa já estar na cabeça das pessoas, porque não é só energia, é uma série de recursos naturais que a gente simplesmente não considera que estão sendo exauridos e comprometidos. É necessário que desde a escola as crianças tenham essa discussão, incorporem essa discussão ao seu cotidiano. Eu também tenho uma dificuldade muito grande de chegar aqui na minha sala e não ligar logo o computador para ver emails, essas coisas. Confesso que tenho. Mas eu também percebo uma grande satisfação quando eu consigo não fazer isso. E essa percepção da satisfação é uma coisa cultural, pessoal, subjetiva. Mas ela precisa ser percebida pelas pessoas. De que o nosso mundo não existe apenas para nos beneficiarmos com essas "comodidades" que a energia elétrica em particular nos fornece. Agora isso exige um esforço, e a gente vive num mundo em que esse esforço de perceber a vida de outra forma não é incentivado. Por isso é difícil. E por isso, para quem quer construir uma usina, quer se dar bem, quer ganhar voto, quer manter a situação de privilégio, seja local ou nacional, para essas pessoas é muito fácil o convencimento que é praticado com relação a essas obras. Por mais que eu tenha sempre chamado a atenção para o caráter absolutamente ilógico da usina, das questões que envolvem a lógica econômico e financeira dessa hidrelétrica, para o absurdo que é a utilização do dinheiro público para isso, para a referência à necessidade de se precisar, num futuro próximo, enfrentar um ritmo violento de custo de vida, emitindo moeda para sustentar empreendimentos como esse, é muito difícil fazer com que as pessoas compreendam a relação dessa situação com as grandes obras. E Belo Monte é mais um instrumento disso. Eu não sou catastrofista, não tenho a percepção maléfica da hidroeletricidade. Não demonizo a hidroeletricidade. Eu apenas constato que, da forma como ela é concebida, particularmente no nosso país nos últimos anos, é uma das bases da injustiça social e da degradação ambiental. Se não é pensando em você, você necessariamente vai precisar pensar nas gerações futuras. Este é o recado para o leitor: é preciso repensar a relação com a energia e o modelo de desenvolvimento, é preciso mudar o nosso perfil industrial e também é preciso mudar a cultura das pessoas com relação aos hábitos de consumo. Nós precisamos mudar a relação que nos leva a uma cega exaustão de recursos.


"Em Brasília há um vírus letal que se chama ‘Brasilite’. É um verme que entra pelo umbigo e faz com que a pessoa se ache o centro do universo"
CÉLIO BERMANN


- O senhor acha que a Dilma tem essa obstinação com Belo Monte, em parte, por teimosia?

Bermann - Ela é muito cabeça dura.

- Às vezes eu acho que as questões subjetivas têm um peso maior do que a gente costuma dar. Não sei...

Bermann - É, mas eu também não sei, não tenho nenhuma proximidade maior com o que ela está pensando agora. O que eu sei é que, no dia a dia, lá no ministério, ela demonstrava uma capacidade muito reduzida de ouvir. Ela pode até ouvir, mas as coisas na cabeça dela já estão postas.

- Por que o senhor saiu do governo em 2004?

Bermann - Porque venceu o contrato, e eu achei que não valia a pena continuar. Há conhecidos meus que foram na mesma época que eu e estão até hoje em Brasília. Não estão mais no ministério, mas estão em Brasília. Acho que Brasília é uma cidade com um vírus letal, que é a "Brasilite". A "Brasilite" se compõe de um verme que entra no umbigo e toma a barriga da pessoa de forma a ela achar que é o centro do universo. A partir daí, mudam as relações pessoais, o que a pessoa era e o que ela passa a ser. Eu mesmo perdi muitos amigos que começaram a empinar o queixo. Fazer o quê? E isso faz parte do “modus vivendi” brasiliense. Basta você ter um terno e uma gravata que você é doutor. Eu acho que a gente não vai muito longe alimentando isso.

- O senhor participou da elaboração do programa de Lula na campanha de 2002 e participou do primeiro ano de governo. Está desiludido?

Bermann – Eu não aceito quando me definem como: "Ah, você também é daqueles que estão desiludidos, estão chateados...". Tem essa conotação, né? Em absoluto. Eu não estou desiludido, chateado, bronqueado. Eu estou indignado!

- Quando o senhor se desfiliou do PT?

Bermann – Ah, quando o bigode do Sarney estava aparecendo muito nas fotos.

(Eliane Brum escreve às segundas-feiras na Revista Época)

Belo Monte, nosso dinheiro e o bigode do Sarney - Parte2


Segundo Celio Bermann Sarney está por trás da aprovação da Hidrelétrica de Belo
Monte, através de José Antônio Muniz Lopes e Edison Lobão, para atender sua patológica sede de poder e para subtrair dinheiro público para seu usufruto e de seu grupo.






- Por que o senhor, assim como outras pessoas que estudam o setor, afirma que a área energética do país é uma “caixa preta”. Afinal, que caixa preta é essa?

Célio Bermann – A política energética do nosso país é uma caixa preta e é mantida dessa forma por uma série de razões. Primeiro, porque a baixa escolaridade da população brasileira não permite, por exemplo, que o leitor da Época entenda o que é terawatts/hora. Mas seria interessante que a população toda tivesse conhecimento e pudesse, com informação, começar a definir junto com empresas e governo os rumos que são mais adequados. Acho que a academia tem um papel fundamental nesse processo. Eu, particularmente, tento, na área do meu conhecimento, procurar as populações tradicionais, mostrar o que é uma usina hidrelétrica, por que alaga quando você interrompe o fluxo, o que é uma barragem, e como isso vai acabar transformando a vida da comunidade. Acho importante que a academia preste esse tipo de informação, já que governo e empresas não o fazem.

- Sim, mas por que o setor energético tem sido uma caixa preta por décadas?

Bermann - A governabilidade foi encontrada através de uma aliança que mantém o círculo de interesses que sempre estiveram no nosso país. É a mesma turma que continua na área energética. E isso é impressionante. A população não participa do processo de decisões. Não existem canais para isso. Ainda no governo FHC, durante a privatização, o governo criou um Conselho Nacional de Política Energética. Nos dois mandatos de FHC participavam os dez ministros, mas havia um assento para um representante da academia e um da chamada sociedade civil. Eles sentavam, discutiam as diretrizes energéticas de uma forma aparentemente saudável, mas, no frigir dos ovos, na prática não mudava nada. De qualquer forma, havia pelo menos esse sentido de escutar. Isso, com Lula, acabou. O resultado do governo "democrático popular" do Lula, nos dois mandatos, e da Dilma, agora, é a negação de escutar outros interesses que não sejam aqueles que sempre estiveram junto ao poder. A própria Dilma, no início do governo Lula, tinha uma dificuldade muito grande de ouvir, de sentar-se com os movimentos sociais e ouvir. Eu tive a oportunidade de vivenciar o primeiro mandato do Lula, lá, em Brasília.

- E qual era o seu papel?

Bermann – Era apagar fogo, este era o meu papel...

- Mas, oficialmente...

Bermann - O meu papel era tentar amenizar um pouco os conflitos, mas, oficialmente, eu fui trabalhar com a Dilma como assessor ambiental no Ministério de Minas e Energia. A ideia inicial era criar uma Secretaria de Meio Ambiente dentro do ministério. Era a época em que tínhamos a Marina (Silva) falando em transversalidade, então havia um ambiente extremamente propício para aparar arestas e ver se a coisa poderia caminhar de uma forma mais adequada. Achei, então, que a melhor forma de fazer isso não era criar um lugar dos ambientalistas no ministério, mas colocar em todas as secretarias do ministério gente que pensasse o meio ambiente. Mas acabei ficando um ano lá em Brasília. Mesmo assim, foi extremamente interessante, porque me permitiu sair da academia e ter, na prática, a percepção de como as coisas se dão no dia a dia dentro do governo.

- E como as coisas se dão no dia a dia dentro do governo?

Bermann – É um horror. É uma lentidão. É um imobilismo. É incrível a capacidade da máquina de governo de fazer de conta que faz sem estar fazendo absolutamente nada. Eu falo isso com todos os pontos nos “is”. No início do governo se buscava um entendimento entre os chamados "ministérios fins" e o meio ambiente. Transportes, por causa da construção de estradas e portos, e Minas e Energia, por causa da atividade mineral, metalúrgica e energética, e as questões ambientais que são intrínsecas a essas atividades. Houve uma boa intenção de levar adiante a possibilidade do estabelecimento de pontos comuns. Fizemos, então, um acordo entre Ministério de Minas e Energia e Ministério do Meio Ambiente em função da definição de "pontos comuns", de procurar verificar onde poderíamos estabelecer alguns consensos. Era um documento em que se definia uma agenda energética e ambiental comuns aos dois ministérios. Se bem me lembro, o documento foi concluído em setembro de 2003. Mas as duas ministras só foram assinar em 31 de março de 2004.

- Por quê?

Bermann – Boa pergunta. Por quê? Boas intenções... mas por quê? Eu realmente não consigo definir exatamente se era uma questão de veleidade... não sei. No final de 2003 a Marina começou a perceber a dificuldade de ela continuar, e o Lula, daquele jeito dele, deixando a coisa acontecer. Naquele momento, o governo poderia ter tido uma agenda comum, um processo extremamente positivo de entender que existem usinas hidrelétricas que não devem ser construídas.


"Em 2003, a Dilma estava feliz porque tinha conseguido afastar a turma do Sarney do setor elétrico" (CÉLIO BERMANN)


- Imagino que não era fácil ser assessor ambiental da Dilma Rousseff...

Bermann - É, foi uma coisa meio... difícil. Como falei, eu tinha uma relação particular com os movimentos sociais e estava mais numa situação de bombeiro. Vou te contar uma coisa, como referência. Eu encontrei a Dilma na posse do (físico) Luiz Pinguelli Rosa, no Rio de Janeiro, como presidente da Eletrobrás. Ela estava extremamente satisfeita, alegre, contente, porque tinha conseguido, politicamente, afastar a turma do (José) Sarney da seara energética. (Luiz Pinguelli Rosa deixaria o cargo em 2004, a pedido de Lula, que precisava colocar alguém ligado ao PMDB e a José Sarney.) Para você ver. Na época, o (José Antonio) Muniz (Lopes) era diretor da Eletronorte... e depois tornou-se presidente da Eletrobrás (de 2008 a 2011).

- O José Antonio Muniz Lopes, um homem da cota do Sarney, é um personagem longevo nessa história de Belo Monte... Só para situar os leitores, em 1989, no último ano do governo Sarney, ele era diretor da Eletronorte e foi no rosto dele que a índia caiapó Tuíra encostou seu facão por causa da proposta de Belo Monte (então chamada de Kararaô), naquela foto histórica que correu mundo. O tal do Muniz já estava lá... Depois de deixar a presidência da Eletrobrás, no início deste ano, continuou lá, agora como diretor de Transmissão da Eletrobrás...

Bermann – Pois então. Naquela época, em 2003, era ele o diretor da Eletronorte que a Dilma tinha ficado feliz por ter conseguido afastar. Por isso que eu falo que não é o governo Lula, é o governo Lula/Sarney. E agora Dilma/Sarney. Constituiu-se um amálgama entre os interesses históricos do superfaturamento de obras, sempre falado, nunca evidenciado. Não se trata de construir uma usina para produzir energia elétrica. Uma vez construída, alguém vai precisar produzir energia elétrica, mas não é para isso que Belo Monte está sendo construída. O que está em jogo é a utilização do dinheiro público e especialmente o espaço de cinco, seis anos em que o empreendimento será construído. É neste momento que se fatura. É na construção o momento onde corre o dinheiro. É quando prefeitos, vereadores, governadores são comprados e essa situação é mantida. Estou sendo muito claro ao expor a minha percepção do que é uma usina hidrelétrica como Belo Monte.

- No momento em que o senhor encontrou a Dilma, logo na constituição da equipe do primeiro mandato de Lula, o senhor conta que ela estava feliz porque tinha conseguido tirar a turma do Sarney do comando da área energética. O que aconteceu a partir daí?

Bermann - A pergunta é: tirou mesmo?

- E qual é a resposta?

Bermann - Naquele momento, manter esse pessoal à distância era estratégico para reconstruir as relações e viabilizar algumas das diretrizes que tinham sido objeto da proposta de governo. O que aconteceu é que a vida dessa situação (de afastamento) foi extremamente curta devido às relações de poder. Eles não gostaram de se sentir afastados. E eu suponho que a percepção do problema da governabilidade no governo Lula foi uma ação desses setores que tinham percebido que estavam longe da teta da vaca e que não podiam continuar assim. Qual era o jeito de fazer? PMDB era oposição. Vamos conversar... E aí se reacomodam as questões. Eu não digo que seja um grupo de ladrões mercenários. Não é isso que está em jogo. Mas essa capilaridade do Sarney permite manter o usufruto do poder. Eu não sou psicólogo para entender o que o senhor Sarney pensa quando vê o Muniz voltar para o governo, ou quando se encontra diante da incapacidade técnica do senador Edison Lobão ao conduzir o Ministério de Minas e Energia no governo Lula e agora no de Dilma. Não há lógica para isso. Vou dizer de novo: não é possível a gente acreditar na capacidade gerencial de um governo que se submete a esse tipo de articulação política, colocando uma pessoa absolutamente incapaz de entender o que é quilowatt, quilowatt/hora. De ir a público sem saber a diferença entre tensão em volts e energia em quilowatts/hora.

- O senhor está falando do ministro de Minas e Energia, Edison Lobão?

Bermann- Edison Lobão.

- E Belo Monte ocupa que lugar nesse jogo?

Bermann - É a oportunidade de se fazer dinheiro e de se reconstituir as relações de poder. Essa obra tinha sido sepultada em 1989, por conta da mobilização da população indígena, e voltou à tona no governo Lula, aprovada pelo Congresso (em 2005) com o discurso de que era um novo projeto.


“O valor de Belo Monte aumentou em mais de R$ 20 bilhões em apenas cinco anos. E deverá ser maior ainda. Sem contar que 80% do financiamento é dinheiro público"
(CÉLIO BERMANN)


- A ameaça de retomar Belo Monte esteve presente também durante o governo Fernando Henrique Cardoso, mas só no governo Lula saiu mesmo do papel, o que ninguém imaginava que acontecesse, devido ao apoio massivo dos movimentos sociais da região à campanha de Lula. O senhor acha que o fato de Belo Monte ter saído do papel tem a ver com a denúncia do Mensalão, em 2005, e a recomposição das forças políticas para a eleição de 2006?

Bermann - Não tenho a mínima ideia. Mas vamos falar em cifras, agora. Em 2006 o projeto foi anunciado com um custo de R$ 4,5 bilhões. Você sabe, as cifras avançaram violentamente. Antes de ir para o leilão, a usina foi avaliada em R$ 19 bilhões. Foi feito o leilão e se definiu um custo fictício de geração de energia elétrica de R$ 78 o megawatt/hora.

- Por que fictício?

Bermann - Fictício porque esse custo não remunera o capital investido. É por isso que várias empresas caíram fora do empreendimento, sob o ponto de vista da geração da energia elétrica. Mas as grandes empreiteiras estão presentes, porque não é na venda da energia elétrica, mas sim na obra que se dá uma parte significativa da apropriação da renda. Com o consórcio constituído com 50% entre Eletrobrás e Eletronorte, as empreiteiras voltaram para fazer a obra. A elas interessa a obra – e não ficar vendendo energia elétrica. Essa situação é entendida pelos dirigentes, pelo governo, como normal. Para o governo federal, é uma parceria público-privada que está dando certo. Em que termos? A obra hoje está oficialmente orçada em R$ 26 bilhões. Imagine, de R$ 4,5 bilhões para R$ 26 bilhões...

- Em cinco anos, o valor da obra avançou em mais de R$ 20 bilhões?

Bermann – Oficialmente está hoje orçada em R$ 26 bilhões. Mas existem estimativas de que não vai sair por menos de R$ 32 bilhões. Isso sem falar em superfaturamento.

- Deste valor, quanto sairá do BNDES, ou seja, do nosso bolso?

Bermann – Oitenta por cento da grana para isso é dinheiro público. O que estamos testemunhando é um esquema de engenharia financeira para satisfazer um jogo de interesses que envolve empreiteiras que vão ganhar muito dinheiro no curto prazo. Um esquema de relações de poder que se estabelece nos níveis local, estadual e nacional – e isso numa obra cujos 11.200 megawatts de potência instalada só vão funcionar quatro meses por ano por causa do funcionamento hidrológico do Xingu. Então, é preciso entender que a discussão sobre a volta da inflação não se dá porque está aumentando o preço da cebola, do tomate, do leite... É por causa da volúpia de tomar recursos públicos que será necessário fabricar dinheiro. O ritmo inflacionário vai se dar na medida em que obras como Belo Monte forem avançando e requerendo que se pague equipamento, que se pague operários, que se pague uma série de coisas e também que se remunere com superfaturamento.


"Com Belo Monte, ganham as empreiteiras e os vendedores de equipamentos. E ganham os políticos que permitem que essa articulação seja possível"
(CÉLIO BERMANN)


- Quem perde a gente já sabe. Agora, quem ganha, além das empreiteiras envolvidas na obra?

Bermann - Há as pessoas que ganham pela obra - fabricantes de equipamentos, empreiteiras. E há quem ganhe não financeiramente, mas politicamente, por permitir que essa articulação seja possível, porque é esse pessoal que vai bancar a campanha para o próximo mandato. É a escolinha ou o posto de saúde que eventualmente aquele vereador, aquele prefeito vai dizer: "É obra minha!". É isso que está em jogo. É dessa forma que a cultura política se estabelece hoje no nosso país. Isso precisa mudar. Como? É complicado.

- O senhor costuma usar a expressão “Síndrome do Blecaute” para se referir ao pânico da população de ficar à luz de velas devido a um apagão energético. Acredita que essa “síndrome” é manipulada pelo governo federal e pelos grandes interesses empresariais para emprestar um caráter de legitimidade a megaobras como Belo Monte?

Bermann – O que eu tenho chamado de "Síndrome do Blecaute" conduz à legitimação de empreendimentos absolutamente inconsistentes. Belo Monte, como foi provado pelo conjunto de cientistas que se debruçaram sobre o tema (painel dos especialistas), é uma obra absolutamente indesejável sob o ponto de vista econômico, financeiro e técnico. Isso sem falar nos aspectos social e ambiental. Mas se dissemina uma ideia do caos e, hoje, há 77 projetos de usinas hidrelétricas somente na Amazônia que utilizam a "Síndrome do Blecaute" para se viabilizarem. O fato de hoje o aquecimento global dominar a mídia e o senso comum, assim como a própria academia, ajuda a mostrar a hidroeletricidade como uma grande maravilha, independentemente do lugar em que a usina vai ser construída e dos impactos que ela vai causar. Mas o que é preciso compreender e questionar? Hoje, seis setores industriais consomem 30% da energia elétrica produzida no país. Dois deles são mais vinculados ao mercado doméstico, que é o cimento e a indústria química. Mas os outros quatro têm uma parte considerável da produção para exportação: aço, alumínio primário, ferroligas e celulose.

- As chamadas indústrias eletrointensivas...

Bermann – Isso. Eu não estou defendendo que devemos fechar as indústrias eletrointensivas, que demandam uma enorme quantidade de energia elétrica a um custo ambiental altíssimo. Mas acho absolutamente indesejável que a produção de alumínio dobre nos próximos 10 anos, que a produção de aço triplique nos próximos 10 anos, que a produção de celulose seja multiplicada por três nos próximos 10 anos. E é isso que está sendo previsto oficialmente.

- O que poucos parecem perceber e menos ainda questionam, quando essas metas são comemoradas, é a forma como o Brasil está inserido no mercado internacional em pleno século XXI. O quanto o fato de nossa economia estar baseada na exportação de bens primários tem a ver com a necessidade de grandes hidrelétricas?

Bermann – Desde a ditadura militar, passando pela redemocratização, pelos sucessivos governos até FHC, tem sido assim. Nós imaginávamos que, com Lula, essa questão ia ser reorientada. Porque o programa de governo em que eu me envolvi preconizava a necessidade dessa mudança. E o que aconteceu? Se você comparar os dados de 2001 com os dados de 2010, vai constatar que a economia brasileira está se primarizando cada vez mais. Isto é: cada vez mais são produzidos no Brasil bens industriais primários, sem agregação de valor. E são justamente os bens primários que consomem muita energia e geram pouco emprego. Além disso, satisfazem uma demanda marcada pelo consumismo. E o Brasil se mostrou incapaz de dizer: "Não, nós não vamos fazer isso".

- E depois esses produtos retornam para o Brasil, via importação, com valor agregado...

Bermann – É. Eu sempre chamo a atenção para o fato de que, do alumínio primário que o Brasil produz, 70% é exportado. E o alumínio consome muita energia. Para se pegar um barro vermelho, que é a bauxita, e transformá-la em alumínio, é preciso um processo de produção extremamente devastador sob o ponto de vista ambiental. Há um primeiro refino para obter a alumina, que é um pó branco. Esse pó branco tem como consequência ambiental uma borra chamada de “lama vermelha”. Um ano atrás, na Europa, na Hungria, houve uma catástrofe em função do rompimento de uma barragem que continha essa lama vermelha e tóxica. Ela se espalhou pelo Rio Danúbio e foi um horror. E cada vez mais se faz isso no nosso país – e, claro, não se faz mais isso nos países centrais. Isso não está acontecendo agora no Brasil, está acontecendo desde os anos 70.


“Com Lula – e agora com Dilma – ocorreu a reprimarização da economia, com exportação de bens primários sem valor agregado, numa subordinação ao mercado internacional"
(CÉLIO BERMANN)


- Houve acentuação desse processo no governo Lula e agora no de Dilma Rousseff?

Bermann – O que acontece a partir de Lula é o que eu tenho chamado de "reprimarização da economia". Nós já tivemos uma época em que a economia dependia basicamente da produção de bens primários: café, açúcar e também alguns bens industriais primários. Depois, tivemos Getúlio Vargas, Juscelino (Kubitschek), e nos anos 50 houve a substituição das importações com a vinda da indústria pesada. Aquele período marca um processo acelerado de industrialização da economia brasileira em que se buscava um desenvolvimento tecnológico para acompanhar o ritmo internacional. Agora, vivemos a reprimarização da economia. E não é uma questão do governo, simplesmente. O governo poderia tornar essa questão pública, dar condições para que a população compreendesse e debatesse o que está em jogo, e isso pudesse servir como base de apoio para uma tomada de decisão do tipo: "Olha, Alcoa (corporação de origem americana com grande presença no Brasil, é a principal produtora mundial de alumínio primário e alumínio industrializado, assim como a maior mineradora de bauxita e refinadora de alumina), vocês não vão continuar aumentando a produção aqui no Brasil. Procurem um outro lugar. A produção de energia elétrica gera um problema ambiental enorme, um problema social enorme, e nós vamos priorizar a demanda da população”. Mas, infelizmente, isso não é feito.

- Mas essa obstinação do governo Lula, e agora do governo Dilma, em fazer Belo Monte, mesmo já tendo um prejuízo de imagem aqui e lá fora, mesmo tendo mais de uma dezena de ações judiciais contra a obra movidas pelo Ministério Público Federal, fora as outras... Essa obstinação se dá apenas por causa do esquema de governabilidade, do esquema político para as eleições a curto e médio prazo, ou é por mais alguma coisa?

Bermann – Isso já não te parece plausível? Ou você acha que tem alguma coisa meio doentia, que precisa ser explicada? (risos)

(A Entrevista Continua)

Belo Monte, nosso dinheiro e o bigode do Sarney Parte1


Um dos mais respeitados especialistas na área energética do país, o professor da USP Célio Bermann, fala sobre a “caixa preta” do setor, controlado por José Sarney, e o jogo pesado e lucrativo que domina a maior obra do PAC. Conta também sua experiência como assessor de Dilma Rousseff no Ministério de Minas e Energia.


POR ELIANE BRUM


ELIANE BRUM

Jornalista, escritora e
documentarista. Ganhou mais
de 40 prêmios nacionais e
internacionais de reportagem.
É autora de um romance -
Uma Duas (LeYa) - e de três
livros de reportagem: Coluna
Prestes – O Avesso da Lenda
(Artes e Ofícios), A Vida Que
Ninguém Vê (Arquipélago
Editorial, Prêmio Jabuti 2007)
e O Olho da Rua (Globo).
E codiretora de dois
documentários: Uma História
Severina e Gretchen Filme
Estrada.
elianebrum@uol.com.br
@brumelianebrum

Se você é aquele tipo de leitor que acha que Belo Monte vai “afetar apenas um punhado de índios”, esta entrevista é para você.

Talvez você descubra que a megaobra vai afetar diretamente o seu bolso. Se você é aquele tipo de leitor que acredita que os acontecimentos na Amazônia não lhe dizem respeito, esta entrevista é para você. Para que possa entender que o que acontece lá, repercute aqui – e vice-versa.

Se você é aquele tipo de leitor que defende a construção do maior número de usinas hidrelétricas já porque acredita piamente que, se isso não acontecer, vai ficar sem luz em casa para assistir à novela das oito, esta entrevista é para você.

Com alguma sorte, você pode perceber que o buraco é mais embaixo e que você tem consumido propaganda subliminar, além de bens de consumo. Se você é aquele tipo de leitor que compreende os impactos socioambientais de uma obra desse porte, mas gostaria de entender melhor o que está em jogo de fato e quais são as alternativas, esta entrevista também é para você.

Como tenho escrito com frequência sobre a megausina hidrelétrica de Belo Monte, por considerar que é uma das questões mais relevantes do país no momento, observo com atenção as manifestações dos leitores que comentam neste espaço ou em redes sociais como o Twitter. Anotei as principais dúvidas para incluí-las aqui e assim colaborar com o debate.

Desta vez, propus uma conversa sobre Belo Monte a Célio Bermann, um dos mais respeitados especialistas do país na área energética. Bermann é professor do Instituto de Eletrotécnica e Energia da Universidade de São Paulo (USP), com doutorado em Planejamento de Sistemas Energéticos pela Unicamp. Publicou vários livros, entre eles: “Energia no Brasil: Para quê? Para quem? – Crise e Alternativas para um País Sustentável” (Livraria da Física) e “As Novas Energias no Brasil: Dilemas da Inclusão Social e Programas de Governo” (Fase).

Ex-petista, ele participou dos debates da área energética e ambiental para a elaboração do programa de Lula na campanha de 2002 e foi assessor de Dilma Rousseff entre 2003 e 2004, no Ministério de Minas e Energia. Célio Bermann foi também um dos 40 cientistas a se debruçar sobre Belo Monte para construir um painel que, infelizmente, foi ignorado pelo governo federal.

Vale a pena ouvir o professor a qualquer tempo. Mas, especialmente, depois de uma semana dramática como a passada. Na quarta-feira (26/10), o julgamento da ação movida pelo Ministério Público Federal reivindicando que os índios sejam ouvidos sobre a obra, como determina a Constituição, foi interrompida e adiada mais uma vez no Tribunal Regional Federal da 1ª Região, em Brasília.

Na mesma quarta-feira, chamado pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA) para explicar por que não suspendeu as obras de Belo Monte, o Brasil não compareceu, desrespeitando o organismo internacional e exibindo um comportamento mais usual em ditaduras.

Em reportagem publicada em 20/10, o Estadão denunciou que, como retaliação por ter sido advertido sobre Belo Monte, o Brasil deixou de pagar sua cota anual como estado-membro.

Na quinta-feira (27/10), centenas de pessoas, entre indígenas, ribeirinhos e moradores das cidades atingidas, ocuparam pacificamente o canteiro de obras de Belo Monte, no rio Xingu, pedindo a paralisação da construção da usina.

Foram expulsos por ordem judicial. Enquanto o canteiro de obras era ocupado por uma população invisível para o governo de Dilma Rousseff, o cineasta Daniel Tendler apresentava no Seminário Nacional de Grandes Barragens, no Rio de Janeiro, o projeto de uma megaprodução cinematográfica que se propõe a documentar as obras de Belo Monte por cinco anos.

O projeto é comandado pela LC Barreto, a produtora da poderosa família Barreto, a mesma que fez “Lula, O Filho do Brasil”. Tendler, aliás, foi um dos roteiristas do filme sobre a vida do ex-presidente. Entre as repercussões da megaprodução cinematográfica sobre a megaobra do PAC no Twitter, destacou-se uma: “Os Barreto estão para o cinema nacional como os Sarney para a política”.

Ainda na semana passada, o governo federal publicou um pacote de sete portarias ministeriais com o objetivo de “destravar a concessão de licenças ambientais no país para acelerar grandes empreendimentos, como rodovias, portos, exploração de petróleo e gás, hidrelétricas e até linhas de transmissão de energia”. Ou seja: o governo caminha para anular as conquistas socioambientais obtidas na redemocratização do país.

Dias antes, em 26/10, o Senado havia aprovado um projeto de lei que retira o poder do Ibama para multar crimes ambientais, como desmatamentos. Se não for vetado pela presidente, o poder de multar passará para estados e municípios, sujeito às pressões locais já bem conhecidas.

A aprovação do projeto aconteceu quatro dias depois de mais um assassinato no Pará: João Chupel Primo, mais conhecido como João da Gaita, foi morto com um tiro na cabeça, depois de denunciar ao Ministério Público Federal, em Altamira, uma rota de desmatamento ilegal na reserva extrativista Riozinho do Anfrísio e na Floresta Nacional Trairão, área do entorno de Belo Monte. Como de hábito, o Congresso decide os rumos do país desconectado com o que acontece na vida real para além do aquário brasiliense.

No momento histórico em que recursos como água e biodiversidade se consolidam como o grande capital de uma nação, o Brasil, um dos países mais beneficiados pela natureza no planeta, corre em marcha à ré. O cenário que você acabou de ler tem no centro – como obra simbólica e estratégica – Belo Monte, a maior obra do PAC. A seguir, parte de minha conversa de quase três horas com o professor Célio Bermann, em sua sala no Instituto de Eletrotécnica e Energia da USP.

(Continua)

Veja entrevista do especialista Celio Bergmann na Parte 1 e 2 na sequência:

terça-feira, 1 de novembro de 2011

Câmara aprova R$430 milhões para Duciomar





Do Blog da Franssinette Lorenzano


A Câmara Municipal cometeu outro ato temerário, hoje, ao aprovar na base do rolo compressor, por 20 a 3 votos, empréstimo de R$430 milhões da Prefeitura de Belém ao BNDES, que comprometerá os recursos do Fundo de Participação dos Municípios para a próxima gestão.

A justificativa do projeto diz apenas que é para beneficiar as avenidas Augusto Montenegro e Almirante Barroso. Não informa como o empréstimo será pago, quais os juros, o prazo, como serão licitadas as obras. Nadica de nada.

Foi um verdadeiro cheque em branco nas mãos do prefeito Duciomar Costa, uma irresponsabilidade e falta de respeito para com a população, até porque ninguém explica como é que essa operação pode ser concretizada se o governo do Estado pretende emprestar o mesmo valor ao BNDES, beneficiando toda a região metropolitana com corredor de transporte, dentro do projeto Ação Metrópole, iniciado na gestão passada, ao invés de apenas duas avenidas.

Hoje foram votados os dois primeiros artigos. O resto ficou para amanhã.

Anotem aí quem votou sim para entregar essa bufunfa a Duciomar: Abel Loureiro (DEM); Amaury Souza (PT), Antonio Vinagre (PMDB), Evaldo Rosa (PPS), Gervásio Morgado (PTB), Iran Moraes (PSB), Luiz Pereira (PR), Miguel Rodrigues (PRB), Nadir Neves (PTB), Nehemias Valentim (PSDB), Orlando Reis (PSD), Otávio Pinheiro (PT), Paulo Queiroz (PSDB), Pio Neto (PTB), Raimundo Castro (PTB), Raul Batista (PRB), Rildo Pessoa (PDT), Vanessa Vasconcelos (PMDB), Walter Arbage (PTB)e Wanderlan Quaresma (PMDB)

Quem votou não: Ademir Andrade (PSB), Carlos Augusto (DEM) e Marquinho (PT)

Estavam ausentes: Augusto Pantoja (PPS), Henrique Soares (PMDB), Mário Correa (PR) e Tereza Coimbra (PTB)

Saíram antes da votação: Adalberto Aguiar (PT), Afredo Costa (PT), Antonio Rocha (PMDB), Fernando Dourado (DEM), José Scaff Filho (PMDB), Nonato Filgueiras (PV), Sahid Xerfan (PP) e Vandick Lima (PP).

Blog denuncia; Vereador Gervásio Morgado tem casa alugada pela prefeitura



Blog denuncia; Vereador Gervásio Morgado tem casa alugada pela prefeitura
(Matéria copiada do Blog da Franssinete Florenzano)

A Câmara de Belém ainda trará ao Pará a alcunha de Sucupira do Norte, em noticiário nacional sobre os absurdos cometidos, que deitam na impunidade.


O notório quase ex-vereador Gervásio Morgado(PTB), aquele que bebeu cerveja em plena sessão plenária, que responde a inúmeros processos judiciais por falta de pagamento dos impostos que deve, e também pelo sumiço de materiais de construção de um de seus vizinhos (com vídeo do condomínio mostrando o modus operandi);

que fez denunciação caluniosa contra mim, [Franssinete Florenzano] com o agravante de ser servidora pública e também responderá por isso; que foi ao TCE-PA exigir que me calassem ou me exonerassem – e eu não me submeti à chantagem e coação moral, deixando a decisão a quem de direito, tendo sido exonerada -, pelo que também responderá; aquele que ofendeu a honra de seus próprios colegas vereadores como Carlos Augusto Barbosa – inclusive a família deste -, e Marquinho do PT – a quem manifestou seu preconceito e menosprezo chamando-o de “ceará”, “cabeça chata” e outros adjetivos pejorativos, alusivos à sua origem pobre e nordestina, em plena sessão ordinária;

aquele que disse “quem mandou não estudar?” referindo-se à situação das famílias dos pedreiros mortos no desabamento do edifício Real Class; aquele que atacou a memória de Roberto Camelier, pioneiro do rádio no Pará, no Brasil e na América Latina, porque quer mudar o nome da histórica Rua dos Apinagés, no Jurunas, contra a vontade dos 66 mil moradores do bairro, que se manifestam dia e noite .


Pois é. A lista é longa e há muito mais a ser revelado. Pois Gervásio Morgado aluga há dois anos para a Prefeitura de Belém, através da Secretaria de Economia, um prédio de sua propriedade, localizado em frente à Igreja da Trindade, onde funcionava antes um curso de informática do qual era dono.
Cliquem em cima das imagens, para facilitar a leitura das publicações no Diário Oficial de Belém. Vejam que, sem licitação, Gervásio Morgado recebe por ano só nesse contrato com a Prefeitura – com a qual é constitucional e legalmente impedido de contratar - R$275.865,84, tudo tirado do meu, do seu, do nosso dinheirinho, que falta para salvar vidas e sobra para a corrupção.


O art. 29, IX, da Constituição Federal, é de clareza cristalina quando diz que as proibições e incompatibilidades, no exercício da vereança, são similares, no que couber, ao disposto para os membros do Congresso Nacional e na Constituição do respectivo Estado para os membros da Assembléia Legislativa (renumerado do inciso VII, pela Emenda Constitucional nº 1, de 1992).


E assim dispõe o art. 54, da CF:
“Art 54. Os Deputados e Senadores não poderão:
I - desde a expedição do diploma:
a) firmar ou manter contrato com pessoa jurídica de direito público, autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista ou empresa concessionária de serviço público, salvo quando o contrato obedecer a cláusulas uniformes;
II - desde a posse:
a) ser proprietários, controladores ou diretores de empresa que goze de favor decorrente de contrato com pessoa jurídica de direito público, ou nela exercer função remunerada;


Art. 55. Perderá o mandato o Deputado ou Senador:
I - que infringir qualquer das proibições estabelecidas no artigo anterior;
II - cujo procedimento for declarado incompatível com o decoro parlamentar;
(...)
§ 1º - É incompatível com o decoro parlamentar, além dos casos definidos no regimento interno, o abuso das prerrogativas asseguradas a membro do Congresso Nacional ou a percepção de vantagens indevidas.
§ 2º - Nos casos dos incisos I, II e VI, a perda do mandato será decidida pela Câmara dos Deputados ou pelo Senado Federal, por voto secreto e maioria absoluta, mediante provocação da respectiva Mesa ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa.”


Por sua vez, a função de controle da Câmara de Vereadores está prevista na Constituição Federal:
“Art. 31. A fiscalização do Município será exercida pelo Poder Legislativo Municipal, mediante controle externo, e pelos sistemas de controle interno do Poder Executivo Municipal, na forma da lei.”


Isso significa que é responsabilidade do vereador fiscalizar e controlar as contas públicas. A Câmara Municipal foi encarregada pela Constituição da República de acompanhar a execução do orçamento do município e verificar a legalidade e legitimidade dos atos do Poder.


Ao invés, disso, o quase ex-vereador Gervásio Morgado vale-se do cargo para lograr proveito pessoal ou de outrem, em prejuízo da dignidade da função pública, com evidente e escandalosa incontinência pública de conduta.


A lei 8429/92 dispõe sobre as sanções aplicáveis aos agentes públicos nos casos de improbidade administrativa e os classifica em três espécies: os que importam em enriquecimento ilícito (art. 9º); os que causam prejuízo ao erário (art. 10); os que atentam contra os princípios da Administração Pública (art.11).


As sanções estão previstas no art.12 e a lei determina que o Judiciário deve aplicá-las levando em conta a extensão do dano e o proveito patrimonial obtido pelo agente.


Como a ninguém é lícito ignorar, a vida pregressa de um parlamentar deve garantir proteção à probidade administrativa e à moralidade no exercício do mandato. Tem que assegurar um mandato bom, honesto, equânime, justo e decente.


Configura lesão aos princípios constitucionais e ao Estado Democrático de Direito manter como representante do povo de Belém do Pará o quase ex-vereador Gervásio Morgado, sobre quem recaem denúncias gravíssimas de prática de condutas indecorosas e lesivas à honra de cidadãos e aos cofres públicos, em desrespeito à lei e à ética. Seus atos são atentatórios aos princípios da moralidade, ofensivos à dignidade do Parlamento, seu comportamento pessoal atira ao lixo o decoro parlamentar e a decência.


E – pasmem! – o quase ex-vereador Gervásio Morgado é o presidente da Comissão de Ética da Câmara Municipal de Belém.