terça-feira, 12 de novembro de 2013

Erro de projeto para transporte fluvial gera gastos bilionários no Pará

 

  Pelo calendário do Ministério dos Transportes, o problema já deveria ter sido resolvido, desde julho de 2011. Hidrovias desafogariam estradas no transporte de produtos agrícolas.

Essa reportagem certamente te deixará indignado. Porque nossa vida seria mais fácil, seria mais barata, o Brasil lucraria mais e poluiria menos, simplesmente se soubéssemos ou pudéssemos usar os rios que cortam todo o país.
Exemplo: economizaríamos quase R$ 4 bilhões por ano. E tiraríamos milhares de caminhões de nossas estradas.
Começa agora mais uma reportagem da série especial “Brasil: quem paga é você”.
Navegar não somente é preciso, mas sobretudo é possível no Brasil, que tem 63 mil quilômetros de rios, lagoas, represas e canais que podem ser usados para a navegação. Só que nem um quarto desses percursos navegáveis é aproveitado.
O meio de transporte mais barato que existe e que permitiu a expansão das fronteiras do Brasil Colonial é hoje considerado um projeto naufragado em descasos e burocracias da república.
Apenas 7% de todas as cargas brasileiras são transportadas por hidrovias. Pelas contas da Confederação Nacional dos Transportes, pelo menos metade dos produtos made in Brazil poderia circular por rios. Mas isso, se tais caminhos estivessem, de fato, abertos.
O Fantástico viajou por 5.700 quilômetros de rios para mostrar o que faz o transporte fluvial brasileiro encalhar.

Norte do Mato Grosso
Norte de Mato Grosso. É onde ficam algumas das maiores e mais produtivas lavouras de soja e milho do planeta. Produzem anualmente 50 milhões de toneladas de grãos.
Riqueza que sai de lá em 1,7 milhão de viagens de caminhão por ano. Média de 4.700 carretas carregadas por dia.
São mais de dois mil quilômetros até os portos do Sudeste e do Sul pela BR-163, para embarcar rumo aos mercados da Europa, Estados Unidos e Ásia.
Rio Teles Pires

Se fosse via Teles Pires, um rio que corre bem no meio das lavouras, os produtos chegariam ao porto de Santarém, de lá para o Oceano Atlântico. Uma economia de mais de quatro mil quilômetros até os mercados externos.
Uma saca de milho na região vale, em média, R$ 9. Para transportar essa saca até o porto de Santos, pela rodovia, o custo do frete chega a R$ 18, o dobro do valor do produto. Se a hidrovia Teles Pires fosse navegável, o frete cairia para menos de R$ 1 por saca. Segundo a Associação dos Produtores da Região, só com combustível, o Brasil economizaria R$ 2 bilhões por ano.
“O transporte hidroviário tem essas características em termos de custo e eficiência energética, e também aspectos relacionados à questão de emissão, ele é imbatível”, explica Bruno Batista, diretor executivo da Confederação Nacional do Transporte.
Os reservatórios de cinco hidrelétricas de médio porte já em construção vão tornar o Teles Pires largo e profundo o suficiente para a navegação ao longo de 850 quilômetros até o Rio Tapajós. Só que faltou planejar a construção das eclusas. Sem elas, as represas se tornarão gigantescos paredões intransponíveis.
Uma falha dessas no projeto original não somente impede a navegação, mas principalmente encarece a obra quando se decide fazê-la depois.

Obra da hidrelétrica em Tucuruí, no Pará.

Foi o que aconteceu em Tucuruí, no Pará. A hidrelétrica ficou pronta na década de 80. Onde também não constava do projeto a construção de eclusas. Resultado: a obra acabou ficando dez vezes mais cara.
O sistema de eclusas da represa de Tucuruí é uma obra faraônica, feita para transpor um degrau de 71 metros de altura entre o nível do rio Tocantins e o do reservatório da usina. Essa obra custou R$ 1,6 bilhão, uma fortuna. E levou três décadas para ser concluída, mas até agora ainda não abriu caminho para o progresso. É que no meio do caminho há pedras.
É um labirinto de 43 quilômetros de rochas entre Marabá, onde começaria a hidrovia, e o lago de Tucuruí. O governo inaugurou as eclusas, mas deixou para trás outro projeto igualmente bilionário: a remoção do Pedral do Lourenço.
As previsões mais otimistas apontam um investimento estimado em R$ 900 milhões para retirar as pedras. As mais pessimistas chegam a R$ 2 bilhões. Enquanto o dinheiro não sai do cofre e os projetos não saem das gavetas, o rio Tocantins, na região do Pedral do Lourenço, só pode ser navegado, no período de seca, por pequenas embarcações como está.
Pelo calendário do Ministério dos Transportes, essas pedras já não deveriam estar mais no local, desde julho de 2011. Mas a obra nem começou. Segundo o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes, o DNIT, o projeto estava muito caro.
“Você constrói a maior eclusa do mundo, que é Tucuruí, mas não consegue resolver o problema de um pedral que existe logo na sequência. Então, na prática, a eclusa não tem utilidade alguma”, declara explica Bruno Batista, diretor executivo da Confederação Nacional do Transporte.
O orçamento deste ano do Ministério dos Transportes destina apenas R$ 400 milhões para todas as hidrovias. Menos da metade do mínimo necessário só para retirar o pedral.
Mesmo assim, o ministro afirma que as obras estão nos planos do governo.
“É um elefante branco? Não. É um elefante e a gente quer montar depois nesse elefante e transformar depois a hidrovia em uma realidade”, declara César Borges, ministro dos Transportes.
Hidrovias também desafogariam as estradas no transporte de produtos agrícolas.
“Aqui tem capacidade de cada comboio levar em torno de mil caminhões. Então a substituição é muito grande desse transporte rodoviário para esse transporte hidroviário”, diz Rogério Rodrigues, produtor rural.
“O mundo inteiro faz questão de navegar as suas commodities de maneiras mais econômicas e mais viáveis, fazendo canais inclusive. E nós temos a dádiva divina de rios, pequenas obras de adequação, e não fazemos e estamos desperdiçando eficiência”, afirma Carlos Henrique Fávaro, presidente da Associação dos Produtores de Soja e Milho de MT.

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